20121106

Crítica da Estética da Mercadoria


"A inovação estética como portadora da função de reavivar a procura torna-se uma instância de poder e de consequências antropológicas, isto é, ela modifica continuamente a espécie humana em sua organização sensível: em sua organização concreta e em sua vida material, como também no tocante à percepção, à estruturação e à satisfação das necessidades"

"[...] o que denominamos tecnocracia da sensualidade significa bem mais que isso. Significa o domínio sobre as pessoas exercido em virtude de sua fascinação pelas aparências artificiais tecnicamente produzidas"

"Naturalmente a diferença fundamental em relação à produção de aparências no capitalismo é que nele se trata, antes de mais nada, de funções de valorização que utilizam, transformam e aperfeiçoam as técnicas estéticas. O resultado não se restringe mais a determinados lugares sagrados ou representativos de algum poder, mas forma uma totalidade do mundo sensível no qual em breve nenhum momento terá deixado de passar pelo processo de valorização capitalista e de ser marcado por suas funções"

"Os indivíduos moldados pelo capital [...] têm um destino instintivo comum, ao menos formalmente: a sua imediaticidade sensual deve ser quebrada e tornar-se completamente dominável"

"A abstração estética da mercadoria liberta a sensualidade e o sentido da coisa portadora do valor de troca, tornando-as separadamente disponíveis."

"Depois que a sua superfície se liberta [...] ela se desprende completamente, descorporifica-se e corre pelo mundo inteiro como o espírito colorido da mercadoria, circulando sem amarras em todas as casas e abrindo caminho para a verdadeira circulação das mercadorias"
"É que sequências intermináveis de imagens acercam-se das pessoas atuando como espelhos, com empatia, observando o seu íntimo, trazendo à tona os segredos e espalhando-os. Nessas imagens evidenciam-se às pessoas os lados sempre insatisfeitos de seu ser. A aparência oferece-se como se anunciasse a satisfação; ela descobre alguém, lê os desejos em seus olhos e mostra-os na superfície da mercadoria"

"Como é que alguém constantemente assediado por uma coleção de imagens de desejos já previamente desvendadas, se comporta e, sobretudo, se modifica? Como é que alguém, que sempre obtém o que deseja - mas somente enquanto aparência - se modifica?"
"O sexual como mercadoria ocorre também historicamente, nas mais diversas fases de desenvolvimento e nas épocas mais distintas. A prostituição nivela-se à simples produção de mercadorias, ou seja à prestação de serviços; a cafetinagem nivela-se ao capitalismo de intermediação; do bordel à manufatura - todas essas formas do sexual como mercadoria têm algo em comum: o valor de uso realiza-se ainda no contato sensório-corporal imediato. No capitalismo industrial valoriza-se a sensação sexual apenas sob a forma de valorização estética - excetuando-se todos os tipos de adereços. Pode-se registrar e reproduzir em série uma mera imagem ou um mero ruído, ou uma combinação de ambos numa tiragem tecnicamente ilimitada - limitada na prática apenas pelo mercado. No estado de repressão sexual geral, ou então de isolamento, o valor de uso da mera aparência reside talvez na satisfação pelo voyeurismo.

Essa satisfação como um valor de uso cuja natureza específica é ser aparência pode ser denominada satisfação aparente. A satisfação com a aparência sexual caracteriza-se por produzir e fixar obrigatoriamente a procura de maneira simultânea à própria satisfação. Quando os sentimentos de culpa e o medo causados por eles dificultam o caminho em direção ao objeto sexual, surge então a mercadoria sexualidade enquanto aparência, intermediando a excitação e uma certa satisfação, muito difíceis de serem desenvolvidas pelo contato sensório-corporal. Esse tipo de satisfação aparente e sem resistência ameaça amputar completamente a possibilidade de prazer direto. 


Nesse caso, a única forma do valor de uso adequada para a valorização em massa reage sobre a estrutura das necessidades. Desse modo, um voyeurismo geral fortalece-se e torna-se habitual e, por conseguinte, as pessoas em sua estrutura instintiva ficam atreladas a ele."

"A repressão do instinto simultânea à satisfação aparente deste leva a uma sexualidade generalizada. 
As mercadorias respondem a isso refletindo imagens sexuais por todos os lados. Nesse caso, não é o objeto sexual que toma a forma de mercadoria, mas a totalidade dos objetos de uso com forma de mercadoria assume tendencialmente de alguma maneira a forma sexual, e desespecificam-se a necessidade sexual e a sua respectiva oferta de satisfação"


"Há nisso um estranho retorno ao ponto de partida histórico-social. Como as mercadorias retiraram a sua linguagem sedutora dos seres humanos, elas lhes devolvem agora uma linguagem que, através da roupa, reveste os estímulos sexuais"

"Enquanto mera estética da mercadoria, ela lhes satisfaz apenas com aparências e mais desperta a fome do que sacia. Enquanto falsa solução da contradição, ela a reproduz numa outra forma talvez bem mais ampla"

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