Mostrando postagens com marcador pedro freitas. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador pedro freitas. Mostrar todas as postagens

20110525

radiografados

destranco portas


por onde passem presenças


indefinidas


almejam um estar


destranco um primeiro armário

o abro ou rompo

e há lá um feto num pote


é seu aniversario, lhe dizem

e ele permanece calado


às vezes, um farol lá da rua esquadrinha-lhe as formas pálidas, esquálidas. quase sem vida.


o feto, porém, se mexe e olha pra mim. mas não respira bem.

distante e opaco engalfinhando horas parcas, irresolutas.

por quanto vale romper um constante prever em troca do descaramento absoluto, conectivos abissais com um mundo já velho mundo?

não respondo nada

pois há algo de mínimo e bonito naquela presença.

para que: distorcer-se em formas múltiplas?

quilos e quilos de pesos, solavancos, passadas descontinuas que retornam?


Nada diz. Emite sons desencontrados, limítrofes, assobios constantes, de tons que um eu meu decodificicador decodifica.


Noutra porta há uma mulher. ou a imagem de uma mulher de cabelo vermelho grená. linda, multiplica-se por outras portas e janelas, capas de revistas, jornais, sites, jogos de espelhos. conexões já infiltradas nascidas do esgoto. esgotamento de uma lógica crescente, científica.


um cientista louco a radiografa constantemente, cataloga sua vida numa pequena máquina. qual deusa em desejos ancestrais, retrata-se de forma perfeita, egípcia.


mas as seguidas radiografias a deformam. seus olhos agora esbugalhados e escamas crescendo em suas costas. não há desejo de sair pro mundo. integra-se a conjunção contínua. logo um líquido que brota de suas mãos e elas mesmo líquido escorrendo, uma tinta viscosa que esparrama pelas frestas do submundo hostil. acachaparam-na num perfil, um pôster esquecido no fundo do armário, lá onde a luz não chega.


o cientista me olha sem entender: o que vale, em nome do progresso? uma radiografia me atravessa, mas não há sequer alma ali. são marcas de um mundo invisível, mas físico. ossos que crescem em progressão geométrica enquanto ensejamos desejos. - e a alma, além? ele chora e não lamento. funde-se num caminho equilátero, a razão ao o oprimir.



libertar-me-ei daquele asilo de loucos


por onde tudo passa


e onde a luz do dia não é contraponto a nada


constitui apenas


os olhares que dirigem a mim, no mundo


já de saída, outro assobio me lembra outra memória


aquela constituída apenas por sensações.


aquela cor, aquela cor não significa nada,


agradeço ao caos, e vou dormir em paz.





20101229

elementos sólidos construídos sob perspectiva euclidiana. o homem atravessava a rua e percebia as faixas de pedestre como paralelas. distraído, um carro de frente o acertou.


na linha do horizonte traçam-se encontros entre todas as outras. as duas surfavam por cima de todas as formas daqueles sólidos geométricos sob perspectiva euclidiana. por trás do grande edifício há outro e outro e uma estrada que se encaminha e árvores, além do céu, e um pedaço de mar. sucediam intercalavam. constantemente afastados, sem bordas de frente ao mar.


pisando na areia todo o mundo se abria em grande angular. as duas mal tinham agora, pra onde correr, mas ensaiavam aproximações. há, abaixo, homens e mulheres de mãos dadas escaldando sobre o sol do meio-dia, em devoção. o que sabiam aqueles homens e mulheres de não traçarem percursos ao se constituírem por meros acasos da vida. a criança tropeça e cai ao correr da onda e o menino ruivo a puxa pela mão, erro de cálculo. há distração.


há também, um porém da desmagnetização da Terra, e a reconstituição do espaço , tão necessária. noutro tempo-lugar, um menino olha o mar, distante. as linhas , forçadas ao retorno reconstituem o mundo e entram pelos dois olhos - há algum encontro interior possível, ou é tudo só imagem? o mundo está pronto e, então, ele perde o interesse.


20090209

ensolarado (a bondade do mundo)

Giravam. Bailavam as gaivotas, como eles. crianças, desenhavam formas improváveis no céu, adivinhando nuvens. Da pedra, pés fincados, desta vez como espectador. Um dia de sol como aquele.

Surgia o rosto, impreciso, mas constante: a boca pequena mas bem marcada por covinhas dos dois lados, os olhos claros, aqueles que pregados nos cantos lhe davam um ar mais misterioso, e um cabelo loiro-castanho-quase-liso, normalmente despenteado. A menina girava. Na imagem, porém, com o sol de frente, suas feições quase se apagavam. Não só isso, o movimento a distorcia, como se ela passasse, e, de repente, não estivesse mais. O que ficava fixo? Ficava o sorriso, presente em todos os momentos em que abriu os olhos e venceu o medo dela soltar a mão. Sorriso-borrão-branco, mas constante, sempre, ainda agora, com as gaivotas, alegria da brincadeira de menina, liberdade longínqua.

Se lembrava como correndo, faceira, lhe escondeu os olhos, e levou-lhe até um canto escuro, nas escadas de serviço. Ali, tirou as mãos, o beijou e saiu correndo. Ele, atordoado, deu voltas atrás a procurando, mas não a achou, se perdendo por ela. Desde então, nenhuma lembrança intacta (porta-retratos).

Saia rodada, a menina rodava. Se lembrava que era um domingo, que fora puxado por ela, e, mesmo rejeitando, se deixou levar até os giros no pátio que terminaram com ela tonta, caindo sobre ele, beijando-o (rapidamente), deixando-se ficar olhando o céu, até esquecer a tonteira e sair correndo para outro canto. Entendeu: Ela, congelada-em-movimento, não era exatamente o que ele pretendia, não podia ser. Não eram os borrões do sol que a marcavam, mas a lembrança. Ela era idéia: a memória pinta a vida em tons pastéis, impressionistas.

Sua cabeça rodava: Surgia o questionamento,: o que era, afinal, aquela menina? Fração de alguma bondade perdida? A menina girava,girava dentro de sua cabeça, com o mesmo sorriso repetido, sempre no mesmo lugar, e naquele lugar onde ela estivera um segundo antes ele procurava o vazio que lhe faltava. Afinal, a menina, sorriso no rosto, escapava a si, girando a toa pela alegria do mundo? Ou, extinguindo o nada, marcava seu papel buscando significados pouco convencionais? Estático, a hipótese se abriu, e a liberdade pareceu atravessar sem ser vista, mas ele olhava de canto de olho.

A gaivota que viu naquele momento, asas de cristal, deu um giro, e bailou entre o mar e o céu, sonsa do que era o que. Talvez não fosse culpa dela, mas das cores que se confundiam, inexistindo o horizonte a sua volta. Já ele não, ele consciente, preso na pedra, vendo á sua frente os seres brincarem na amplitude.

Já em si, viu as gaivotas se aproximarem mais da onde estava. Seria algum cardume de peixes que passava por ali, provavelmente? Não, Era hora de se lançar a frente, e desta vez por espontânea vontade. Enquanto os giros, a imagem da menina ia se desfigurando: Se desfizeram olhos, suas formas infantis: mudava, quanto mais rápido. E a mesma imagem, a menina estampada em luz, o sorriso. Ela, girando. Ele sequer sentia seus pés, e nem tinha medo de soltar as mãos, já de olhos abertos. Á sua frente, o fundo azul, o tempo que passava borrado e o mesmo sorriso. Entendia: estava solto, ela a seu lado, amor,, o baile, mãos na cintura, nada em volta. mais rápido, e o pátio e o rosto: um borrão, ensolarado. as mãos não tão firmes, o sorriso convertido em luz, jogados na amplitude, giravam como as gaivotas: decresceu: bondade do mundo não existir.