Hélio e Niltão existem nos concertos de música
erudita contemporânea em São Paulo.
Niltão sempre é visto antes, pois é
grande e se veste com jaqueta militar, coturnos, boina, barba espessa, óculos,
palito de dente (ou talvez um cotonete sem algodão) e bengala com símbolo
maçônico.
Hélio é
pequeno, careca, calado, sorridente e carrega uma pasta de couro.
Hélio e Niltão referendam o concerto: se ambos
comparecem, pode-se considerá-lo um marco na agenda cultural; se apenas um
marca presença, trata-se de um evento underground.
Mas
eles estarão lá, inevitavelmente, antes e depois do concerto, em um canto
qualquer.
Não
é todo mundo que se aproxima para conversar com Hélio ou Niltão, mas o freqüentador mais ou menos
assíduo certamente já se permitiu uma aproximação maior.
Niltão é quem puxa papo, iniciando a
conversa como quem conversa com um velho conhecido. Ele fala em voz baixa e
obriga o interlocutor a se aproximar para ouvi-lo por entre a barba.
Hélio apenas sorri e cumprimenta com a
cabeça.
E
se o interlocutor já conversou ao menos duas vezes com Niltão, há grandes chances de que saiba
algum detalhe de sua vida pessoal: sua mãe judia; sua experiência no exército;
sua iniciação maçônica; seu aperto financeiro.
Hélio ouve as histórias repetidas
vezes, calado, sorrindo.
Mas
basta uma conversa para que o interlocutor ouça Niltão reclamar sobre a precariedade do
cenário erudito brasileiro: as orquestras tocam apenas velharias, sempre
velharias; onde estão as novidades? E se algo interessante aporta por aqui, o
preço é uma barbaridade, seja de vinte a duzentos reais. E Niltão
dará ao menos dez
exemplos de eventos promissores que o decepcionaram por completo.
Hélio – “o carequinha”, como o chama Niltão
- concordará, talvez
com algumas palavras. E depois sorrirá.
Onde
eles moram? Como moram? Como vivem?
Acho que eles não são de mentira.
Imortalizados em puro ouro cor-de-rosa.
ResponderExcluirFantasticaria!
ResponderExcluirEles existem nos concertos. Quem vai somos nós.