20090531

Minhas pastilhas acabaram hoje - pt. 1

Minhas pastilhas acabaram hoje. Ainda bem – elas me obrigavam a mastigar, movimento que odeio. Não há nada pior do que movimentar a mandíbula sem que seja extremamente necessário. Meus dentes sempre ardem quando tenho que falar alguma coisa, como se um gelzinho ficasse se esfregando neles, fazendo barulhinho de borracha, que dá aflição.

Alberto apareceu outro dia aqui com uma colher cheia de brigadeiro. Pediu que eu abrisse a boca que ele me dava, e eu abri, besta, e ele ia pra frente e pra trás com a colher e eu mordiscando e mordiscando o ar. Panaca, foi como se meus molares se oxidassem por completo em questão de segundos, com o ar sendo movimentado.

Eu sempre falo com a boca mais do que semicerrada, completamente fechada, eu diria. Um toque do velho Oeste, por assim dizer. E hoje, sem as pastilhas – finalmente hoje, ou seja, é uma sensação nova – minha mandíbula terá o repouso que sempre sonhou.

Agora é o momento certo de me esconder, de permanecer exatamente assim quietinho no meu quarto. Não vai demorar até virem atrás de mim com algum substituto, um xarope talvez. Eu só teria que esticar o biquinho, não seria nenhum esforço, mas uma questão de....dignidade, provavelmente, por quê haveria eu de tomar o xarope, se ele me seria oferecido justamente porque sabem que as pílulas enfastiam-me?

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