20101019

Literatura Publicista

Dois pequenos-bois encontravam-se atónitos. À frente deles (na hierarquia, porque no carro era de trás que estralava o chicote) estava um senhor admirável que já há algum tempo cuidava de imaginar ser possível plantar algo bom, mas se via sem perspectivas e com os dois tocava para a rodovia. Ao menos seu filho continuava na chaloça pra ver se surgiam uns brotinhos, hêm. E, bem, cansados demais para andar ou não, lá iam os pequenos-bois em frente balangueando com músicas na cabeça.



O que estava mais à esquerda já parara de ruminar o último matinho que arrancara do campo há um tempo, mas ainda guardava ali entre os dentes tudo que seu maior companheiro do passado – também boi, mas já aposentando-se com honras - lhe dera: um broto especial, que todos queriam saborear e que ele havia sido bom o bastante para guardar para o momento em que pudesse dividir com todos.

Olhava para frente quando dava e o sol estava deixando ele vermelho, mas não ligava, porque pelo menos o mantinha acordado. A despeito de tudo, ele ainda tem mais fôlego do que seu companheiro, que já se anuncia mais velho...também, pudera, era um boi que circulara mais por essas fazendas ditas importantes. Havia sido de outros donos, de outros tempos, já fora até mesmo garanhão e até mesmo se achava meio pastor às vezes. Mas dessa vez estava uns dois passos atrás e até um pouco amarelado de sabe-se lá o que. Bolsas fundas lá nos olhos dele.

Uns passarinhos bicudos ora pousavam nele, ora se rebuliçavam por cima e davam umas mordiscadas, mas... ele não parecia se incomodar muito, não. Resmungava, fingia que não estavam lá, mas era quase que necessário. “Coitados, veja só o sol. Pelo menos assim têm companhia de alguém maior...”

“Hêm. Boi é tudo igual. Boi é tudo igual”, resmungava o senhor que bem ou mal tinha lá o freio e o chicote nas mãos.


E enquanto passavam e passavam devagar, os dois bois sentiam que não agüentariam. Bem, um deles teria que permanecer para carregá-lo...o outro, que se esfalfe, que não vai ter jeito. O sol cada vez mais forte....e eis que um dos dois, que infelizmente não pude ver pois na hora fiquei de ponta-cabeça e perdi as noções de direita e esquerda, se desprendeu, foi chicoteado pelo dono por isso e ainda se espreguiçando e mugindo meio fraco caiu na beira da estrada. O dono e o boi ainda atrelado olharam por alguns instantes, mas tem-se que prosseguir e tiveram que deixá-lo lá mesmo.

O boi caído continuava achando que poderia voltar, mas...que baita sol e que tristeza de se ter solto, que grande vergonha. Cedo ou tarde iria acontecer, mas...nunca se sabia quando e ele muito menos, todos diziam que ele agüentaria certeiro até o fim, mesmo quando duvidavam de sua capacidade no começo...

Ele respirou fundo, levantou o pescoço e deu uma olhada em volta para ver se encontrava alguém, e ei-lá que viu um espantalho mirrado, mirrado, mas de porte ainda sisudo que o encarava de longe. O sol devia fazer mal igual pros dois, ele pensou, que não tinham nada ali.
O boi conseguiu se arrastar até o espantalho, que meio antipático ou não era a única companhia no momento. Ele levantou o que conseguiu do pescoço e esperou o espantalho se manifestar. Ele se virou ali, mostrou ao boi que os dois tostariam, mas...arre, que dali a alguns anos tudo aconteceria de novo. O boi caiu morto.

O espantalho suspirou e...ainda encontrando ânimo, disse:



- Viva o Brasil!

2 comentários:

  1. Assim que eu gosto!
    Ganha de lavada daquela chatice do Rosa.

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  2. Viva! E o henrique e sua mania de nos colocar como novos cânones.

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