20120815

Os poderes de Grayskull

– Você tá gostando, amor?

– O quê? Fala mais alto! Essa merda de música tá me deixando surdo.

– Perguntei se você tá curtindo a festa.

– Curtindo? Eu odeio carnaval! Acho que já engoli meio quilo de confete.

– É só fechar a boca que não entra mosca nem confete. Além do mais, ninguém te obrigou a vir.

– Eu é que não ia deixar você vir sozinha.

– Sozinha, não. Todas as minhas amigas da faculdade estão aqui.

– E todos os amigos, também. Aliás, eles devem tá se deliciando com essa tua fantasia de colegial.

– Mas o que você queria? Que eu viesse naquela fantasia de freira que você me comprou?

– Fantasia que, por sinal, me custou uma nota.

– Então por que não trocou por uma de padre pra você?

– Pra morrer nesse puta calor?

– Ah! Eu que me fodesse num hábito de freira enquanto você fica aí, na maior folga, vestido de havaiano?

– E por que você não veio de havaiana, também?

– Tenha dó! Eu vou continuar sambando com as minhas amigas. Você vai ficar aí, sentado?

– Vou ficar aqui vendo você se exibir pro He-Man.

– O quê?

– Pensa que eu não te vi no maior papo com o He-Man agora há pouco?

– O cara é meu colega de faculdade.

– Mas tá louco pra te mostrar a Espada Justiceira.

– A Espada Justiceira não é do He-Man. É dos Thunder Cats.

– Isso! Mostra pra todo mundo que eu não conheço os desenhos da tua infância. Grita que o teu marido é do tempo do Nacional Kid.

– Para de besteira!

– Besteira, nada. Parece que você sente prazer quando deixa bem claro que tem um marido vinte anos mais velho.

– E sinto mesmo. Por que eu deveria ter vergonha do homem que eu amo? Eu não troco meu maridão de quarenta e cinco por nenhum moleque dessa festa.

– Então porque você tava tão empolgada com o He-Man?

– Ai, meu Deus... Vai dizer que você não percebeu?

– Não percebi o quê?

– O He-Man tá mais pra She-Ha. O cara é gay!

– E daí? Gay também tem pau.

– Puta que pariu! Ciúme de gay já é demais.

– Tá bom, desculpa. Olha... Eu quero ir embora. Esses malditos sambas enredos tão me matando.

– Pode ir. Eu vou pegar outra cerveja e continuar sambando.

– Não, espera... Eu preciso de você. Vamos sentar um pouco no jardim, longe dessa barulheira toda.

– Então me ajuda a atravessar o salão porque eu tô muito bêbada.

– Quantas cervejas você tomou?

– Duas latinhas.

– Não é muito.

– E três caipirinhas.

– Porra! E eu achando que era refrigerante que você bebia naqueles copos.

– Se você tivesse perto de mim, ia saber o que eu tava bebendo. Mas você ficou longe o tempo todo.

– Cuidado que o chão tá escorregando aqui.

– Eu queria tanto te apresentar pros meus amigos. Mas você fica se escondendo, me vigiando como se fosse um detetive.

– Ali tem um banco vazio.

– Ainda dá pra ouvir a música daqui.

– Mas pelo menos não tá explodindo nos meus ouvidos. Lá dentro tava muito alto.

– Tava nada. Você que é cheio das viadagens.

– Viado é seu amigo He-Man.

– Mas bem que você deixou ele chupar seu pau no banheiro.

– O quê!?

– Ele não sabe que você é meu marido e me contou tudo.

– Tudo o quê?

– Que chupou um havaiano no banheiro.

– Tem muitos havaianos nessa festa.

– Mas você deve ser o único com uma tatuagem do Nacional Kid na virilha.

– De onde saiu essa bicha? Eu te vigiei um tempão e não vi esse fulano no teu grupo em nenhum momento.

– Ele tinha acabado de chegar na festa quando foi pro banheiro. Eu imagino a sua cara quando viu a gente conversando.

– Olha, eu posso explicar tudo.

– Não precisa explicar nada. É carnaval, todo mundo tá bêbado. É possível perdoar uma pequena traição.

– Mas não foi uma traição!

– Trepar com outra pessoa não é traição?

– Eu não trepei! Foi só um boquete. Sexo oral não é sexo.

– Quem disse isso?

– Bill Clinton, presidente dos Estados Unidos.

– Ex-presidente!!!! Escuta, vamos parar de falar nisso. Eu te amo e não vai ser um boquete que vai atrapalhar nossa vida.

– Espera um pouco. Se você tá aceitando tudo com essa calma é porque alguma coisa você aprontou.

– Aprontei o quê?

– Você trepou com alguém nessa festa?

– Nessa festa, não!

– Como assim nessa festa, não!? Você trepou com outra pessoa depois que a gente se casou?

– Deixa eu pensar.

– Como assim deixa eu pensar!? Você já me traiu?

– Só uma vez.

– O quê? Você me traiu com quem!?

– Com o He-Man.

– Porra! Mas aquela Fanta não é uva!?

– Sim, mas... Aconteceu logo que a gente entrou na faculdade. Ele ainda era virgem e tinha dúvida se era gay ou não.

– E você, amiga pra todas as horas, transou com ele pra tirar a dúvida.

– Isso.

– Ah, meu caralho! Agora só falta você me dizer que gozou.

– Gozei.

– Puta merda! Comigo você não goza, mas com um viado...

– Eu quero ir embora.

– Ele te procurou outras vezes?

– Não. A crise passou e ele assumiu que é gay.

– Que maravilha! Primeiro te come e depois decide que é bicha.

– Será que dá pra gente ir embora?

– Ah! Você não quer continuar sambando!? Que tal dar uma gozadinha com seu colega de faculdade antes de ir?

– Para com isso!

– Parar por quê? Não tá aguentando o tranco? Você acha que pra mim tá sendo fácil escutar essas coisas!?

– Acho que não. Fácil mesmo é saber que o marido da gente deixa qualquer um chupar o pau dele no banheiro.

– Você gosta desse cara?

– Eu não quero mais discutir. Vamos embora?

– Vamos. Mas antes você vai falar com o He-Man.

– Falar o quê?

– Pergunta se ele topa uma ménage à trois.

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