– Você tá gostando,
amor?
– O quê? Fala mais
alto! Essa merda de música tá me deixando surdo.
– Perguntei se você
tá curtindo a festa.
– Curtindo? Eu odeio
carnaval! Acho que já engoli meio quilo de confete.
– É só fechar a boca
que não entra mosca nem confete. Além do mais, ninguém te obrigou a vir.
– Eu é que não ia
deixar você vir sozinha.
– Sozinha, não. Todas
as minhas amigas da faculdade estão aqui.
– E todos os amigos,
também. Aliás, eles devem tá se deliciando com essa tua fantasia de colegial.
– Mas o que você
queria? Que eu viesse naquela fantasia de freira que você me comprou?
– Fantasia que, por
sinal, me custou uma nota.
– Então por que não
trocou por uma de padre pra você?
– Pra morrer nesse
puta calor?
– Ah! Eu que me
fodesse num hábito de freira enquanto você fica aí, na maior folga, vestido de
havaiano?
– E por que você não
veio de havaiana, também?
– Tenha dó! Eu vou
continuar sambando com as minhas amigas. Você vai ficar aí, sentado?
– Vou ficar aqui
vendo você se exibir pro He-Man.
– O quê?
– Pensa que eu não te
vi no maior papo com o He-Man agora há pouco?
– O cara é meu colega
de faculdade.
– Mas tá louco pra te
mostrar a Espada Justiceira.
– A Espada Justiceira
não é do He-Man. É dos Thunder Cats.
– Isso! Mostra pra
todo mundo que eu não conheço os desenhos da tua infância. Grita que o teu
marido é do tempo do Nacional Kid.
– Para de besteira!
– Besteira, nada.
Parece que você sente prazer quando deixa bem claro que tem um marido vinte
anos mais velho.
– E sinto mesmo. Por
que eu deveria ter vergonha do homem que eu amo? Eu não troco meu maridão de
quarenta e cinco por nenhum moleque dessa festa.
– Então porque você
tava tão empolgada com o He-Man?
– Ai, meu Deus... Vai
dizer que você não percebeu?
– Não percebi o quê?
– O He-Man tá mais
pra She-Ha. O cara é gay!
– E daí? Gay também
tem pau.
– Puta que pariu!
Ciúme de gay já é demais.
– Tá bom, desculpa.
Olha... Eu quero ir embora. Esses malditos sambas enredos tão me matando.
– Pode ir. Eu vou
pegar outra cerveja e continuar sambando.
– Não, espera... Eu
preciso de você. Vamos sentar um pouco no jardim, longe dessa barulheira toda.
– Então me ajuda a
atravessar o salão porque eu tô muito bêbada.
– Quantas cervejas
você tomou?
– Duas latinhas.
– Não é muito.
– E três caipirinhas.
– Porra! E eu achando
que era refrigerante que você bebia naqueles copos.
– Se você tivesse
perto de mim, ia saber o que eu tava bebendo. Mas você ficou longe o tempo
todo.
– Cuidado que o chão
tá escorregando aqui.
– Eu queria tanto te
apresentar pros meus amigos. Mas você fica se escondendo, me vigiando como se
fosse um detetive.
– Ali tem um banco
vazio.
– Ainda dá pra ouvir
a música daqui.
– Mas pelo menos não
tá explodindo nos meus ouvidos. Lá dentro tava muito alto.
– Tava nada. Você que
é cheio das viadagens.
– Viado é seu amigo
He-Man.
– Mas bem que você
deixou ele chupar seu pau no banheiro.
– O quê!?
– Ele não sabe que
você é meu marido e me contou tudo.
– Tudo o quê?
– Que chupou um
havaiano no banheiro.
– Tem muitos
havaianos nessa festa.
– Mas você deve ser o
único com uma tatuagem do Nacional Kid na virilha.
– De onde saiu essa
bicha? Eu te vigiei um tempão e não vi esse fulano no teu grupo em nenhum momento.
– Ele tinha acabado
de chegar na festa quando foi pro banheiro. Eu imagino a sua cara quando viu a
gente conversando.
– Olha, eu posso
explicar tudo.
– Não precisa
explicar nada. É carnaval, todo mundo tá bêbado. É possível perdoar uma pequena
traição.
– Mas não foi uma
traição!
– Trepar com outra
pessoa não é traição?
– Eu não trepei! Foi
só um boquete. Sexo oral não é sexo.
– Quem disse isso?
– Bill Clinton,
presidente dos Estados Unidos.
– Ex-presidente!!!!
Escuta, vamos parar de falar nisso. Eu te amo e não vai ser um boquete que vai
atrapalhar nossa vida.
– Espera um pouco. Se
você tá aceitando tudo com essa calma é porque alguma coisa você aprontou.
– Aprontei o quê?
– Você trepou com
alguém nessa festa?
– Nessa festa, não!
– Como assim nessa
festa, não!? Você trepou com outra pessoa depois que a gente se casou?
– Deixa eu pensar.
– Como assim deixa eu
pensar!? Você já me traiu?
– Só uma vez.
– O quê? Você me
traiu com quem!?
– Com o He-Man.
– Porra! Mas aquela
Fanta não é uva!?
– Sim, mas...
Aconteceu logo que a gente entrou na faculdade. Ele ainda era virgem e tinha
dúvida se era gay ou não.
– E você, amiga pra
todas as horas, transou com ele pra tirar a dúvida.
– Isso.
– Ah, meu caralho!
Agora só falta você me dizer que gozou.
– Gozei.
– Puta merda! Comigo
você não goza, mas com um viado...
– Eu quero ir embora.
– Ele te procurou
outras vezes?
– Não. A crise passou
e ele assumiu que é gay.
– Que maravilha!
Primeiro te come e depois decide que é bicha.
– Será que dá pra
gente ir embora?
– Ah! Você não quer
continuar sambando!? Que tal dar uma gozadinha com seu colega de faculdade
antes de ir?
– Para com isso!
– Parar por quê? Não
tá aguentando o tranco? Você acha que pra mim tá sendo fácil escutar essas
coisas!?
– Acho que não. Fácil
mesmo é saber que o marido da gente deixa qualquer um chupar o pau dele no banheiro.
– Você gosta desse
cara?
– Eu não quero mais
discutir. Vamos embora?
– Vamos. Mas antes
você vai falar com o He-Man.
– Falar o quê?
– Pergunta se ele
topa uma ménage à trois.