20110215

Uma resposta

Faz algum tempo que quero falar disso, cerca de vinte minutos, mas queria escrever sobre o tema no BrOffice e não o tinha instalado. Por outro lado, foi uma desculpa válida para enfim instalá-lo.
O fato: li um texto de um filósofo sobre toda a confusão em torno do possível fechamento, por motivos econômicos, do cinema HSBC Belas Artes, em São Paulo; a questão do papel estatal na pendenga etc.
Resumidamente, o texto insinuava a existência de uma dicotomia de posições sobre a questão, colocando de um lado os defensores de que o mercado deve prevalecer no caso (ou seja: um cinema de salas vazias não deve continuar aberto) e de outro os que acreditam que as contas públicas devem atuar na cultura. A argumentação não seguia por este lado, mas sim em que Enfim, leiam-no aqui: http://meocaso.wordpress.com/2011/02/14/cinema-mercado-e-outras-milongas/ (e lá se vai o suspense).
Pois bem discordo de quase tudo o que foi dito, então gostaria de tecer e teço os seguintes comentários:
Primeiro, os cinemas de rua (e até o Belas Artes) são economicamente viáveis, tanto que existem e recebem patrocínios de bancos, de livrarias, do raio que o parta. Ah, mas eles precisam de patrocínio, dirão. Sim. E os conseguem. Ou seja: economicamente viáveis. E até mesmo o Belas Artes, polêmica à parte, consegue e conseguiu patrocínio. Ou seja: a discussão não é tanto sobre a manutenção do cinema, mas sim sua manutenção naquele ponto específico, o que já demonstra que se trata mais de preciosismo do que de verdadeiro amor à cultura, essa linda.
Segundo, é mais democrático preservar o interesse duns poucos (sejam eles movidos por amor a isto ou àquilo) do que atender aos clamores populares exercidos na forma de procura e demanda, porque democracia não é mais atender às maiorias, mas sim permitir que as minorias subsistam enquanto tais. É pra isso que o Estado serve (e, sim, para manter a cultura, ainda que seja cultura marginalizada ou elitizada ou somente atraente a poucos, o que é outro problema). E, aliás, não existe no mundo coisa mais bonita do que a cidade inteira pagar para que eu possa ver filmes numa sala vazia. A cidade, nada. O país.
Defendo, então, que o Estado se meta – quer por tombamento, quer por auxílio monetário – no direito de o Belas Artes ficar ali? Não, não defendo. Gostaria, até, se me pedissem a opinião, que ficasse, mas não é direito e não tem cabimento o Estado se meter no que, na verdade, é um contrato de aluguel entre duas partes privadas e plenamente capazes.
Que o Estado cuide da manutenção da pluralidade cultural, claro, mas que não se meta nos contratos de aluguéis alheios. Porque é isso o que ocorreu: um contrato de aluguel que não se quis renovar. Não foi uma violência contra o Cinema, assim, em maiúsculas, como se quis fazer crer, não foi um ato de arbitrariedade e violência. Foi um termo de aluguel que venceu e não se renovou tempestivamente.
Mas o que mais me incomoda é que existe uma coisa muito importante sobre o Belas Artes que ninguém diz: ele não é um bom cinema. As salas são ruins. A pipoca não é grande coisa e é servida num recipiente de papelão que se abre embaixo e faz cair tudo. Eles exibiram Medos Privados em Lugares Públicos por mil anos (e é um filme chato, ruim e raso).
Está bem, eles têm uma seleção de filmes variada, indo dos blockbusters a, bem, Medos Privados em Lugares Públicos. Mas outros cinemas também têm e não motivam esse auê todo. A Paulista está lotada de cinemas exibindo filmes europeus e asiáticos e brasileiros e, de um modo geral, são cinemas melhores, mais modernos e com pipoca mais gostosa (ou pelo menos servida em saquinhos de papel sem furos).
Com todo o respeito, só o Noitão, mesmo, é que me faz ir até o Belas Artes. E se houvesse noitão no Espaço Unibanco, ali na Augusta, por exemplo (como já houve), aposto que seria melhor.

9 comentários:

  1. Gosto do Belas Artes. É uma bosta, mas é bom.

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  2. Concordo, enfim. É uma bosta, sim, mas também tenho um pouco de simpatia...
    Mas também concordo, as salas são ruins (da pipoca nunca soube, nem quis saber, que eu não sou de ir no cinema pra comprar pipoca), o que é uma pena.

    Em tempos: eu adorava o Gemini, que fechou de uma vez por todas sem ninguém gritar por ele.
    Claro, não passava Medos Públicos, aliás só passava filme estranho (lá assisti Princesas e Casamento Silencioso) ou de refugo... Mas eram salas imensas com telas imensas e um cheirinho de anos 60/70 que era impagável!

    Enfim. Uma hora tudo acaba. O Belas vai fazer falta, sim, mesmo tendo salas terríveis e filmes que eu não queria ver.

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  3. Mas eu não defendi nenhuma das coisas que você "discordou"; na verdade, eu só reproduzi o que vinha sendo falado por aí. Ei-los:

    http://www.ocidentalismo.org/2011/01/o-nosso-cinema-paradiso.html

    http://www.ocidentalismo.org/2011/01/cine-belas-artes-e-o-custo-oculto-da.html

    http://www.ocidentalismo.org/2011/01/ainda-o-belas-artes.html

    http://relances.wordpress.com/2011/01/20/o-caso-belas-artes/

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  4. Você diz que fica sem argumentos diante da ideia de sustentar que a cidade toda pague pelo seu cinema.

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  5. Tipo sogra quando morre. Não gostava de frequentar, mas vou no enterro me lamentar. Acho que é uma questão de amor presente, você continua com a filha dela, fazendo suas coisas, e deixa alguma herança, que também vai passar.
    A Cinemateca também é histórica, mas todo mundo ama de longe. Quem sobrevive assim? Joana d'Arc?
    Se é um absurdo tem que ter revolta, dormir lá no cinema, levar a namorada, recriar a cinefilia na parada, sugerir coisas pra chefia, mobilizar alguma coisa nem que seja pra morrer bonito. E eu como cinéfili não tenho nem vontade de fazer isso. Porque é simplesmente histórico. O que é história morreu hoje, não serve pra manter a vida. Cinema de rua é cinema cotidiano, não uma vitrine da luta udigrudi que minha mãe chora dizendo que via Bergman e cia por lá.

    O Hsbc é uma sogra. E eu queria que fosse minha namorada. Sempre. Não rolou.

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  6. Isso me lembrou: http://www.youtube.com/watch?v=dZLfasMPOU4

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  7. Mas eu ficar sem argumentos significa, justamente, que eu quero, intuitivamente, defender alguma coisa, mas não acho meios para argumentar racionalmente a favor dela.

    Eu acho complicado que financiem essas coisas: porque como decidir o que é válido culturalmente, para receber um patrocínio estatal, e o que não é? O que não significa que eu seja contra a existência desses patrocínios, pelo contrário.

    De qualquer forma, nem é isso que aconteceu no Belas Artes e, bem, eu sabia disso e inclusive comentei no texto. É que outras pessoas vieram acusando de ser subsídio etc., e me interessava mais essa discussão.

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  8. Seja como for, um amigo destacou que, com a confirmação do fechamento do cinema, abriu-se a possibilidade de a região finalmente receber um Burger King 24h.

    Diante dessa perspectiva, concluo que foi para o bem, mesmo, o fechamento.

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