Ele cai no chão e olha pra cima e não acredita – não na dor, porque a dor não se deixa negar, mas sim no que ela significa. A dor, o soco invisível no nariz, o chão embaixo dele, tudo isso podia fazer sentido, mesmo que não fizesse muito. Mas aí tinha os dedinhos e a mão, o braço saindo até o cotovelo e se agarrando no seu rosto, nos galhos das árvores, se puxando (bebê-parteira) pra fora do seu ouvido. Caiu no sono porque era tudo o que podia fazer, as forças sem força nem pra cair.
O dia seguinte foi estranho, sol, mato, mas tudo não passou de um sonho, um mal súbito (ah!, claro, os chocolatinhos mentolados no café, aquilo não podia fazer bem!, ou o chope com fanta, quem sabe) e toda a questão foi ralo abaixo no seu banheiro de luxuosos 2m². Ajeitou uma roupa qualquer no corpo e saiu empurrado por uma agonia que não queria deixar de passar – fome ou ressaca, mas de quê?.
Verde, apressou o passo, verde, verde, verde, correu, verde, vermelho e vermelho e uma combe, uma moto, três carros, um ônibus (verde, mas escuro). A faixa lhe encarou tipo “qualé”, a rua vazia rugiu e ele sabia que não tinha problema, o silêncio de domingo, uma corridinha e ele estava quase lá, claro, e foi andando e estaria lá, não fosse aquele som horrível, mugido-buzina e cheiro de pneu queimando.
Dobrou a esquina com raiva, criança terrível tentando lhe arrancar o couro, isso não!, e foi jogá-la contra o poste ou o muro ou o ponto infinito entre o vácuo e o cosmo centrípeto de uma curva exageradamente rápida, mas ela se agarrou e balançou e quase lhe cravou um espinho nas costas antes da árvore abraçar e jogar o corpinho bem-exercitado longe no espaço, sobre as pedras e o asfalto e o poste, poste, poste, faixa-faixa-faixa-faixa-faaaaaaaaaaaaaaaaaaaaaixa...
Blam!: ela veio voando e ele não conseguiu nem terminar o primeiro passo na primeira das faixas de pedestres. Um abraço instantâneo e aí rolar no chão ouvindo um grito de pneus e o motor rugindo selvagem pra longe dali. Ela desacordou em cima dele, logo dele, e ele caiu no chão e olhou pra ela e não acreditou em nada daquilo, naquela mão.
Acordou, acordou?, incrível, não se quebrou ao meio nem nada, quem é?, quem é o qual. Foram pra fora buscar a fresca.
Coalhada, sério?
Sério, você nunca comeu?
Não desse jeito, não. Mas, enfim, é a vida, e vocês todos ainda fumam, assim?
Embaixo da ponte, ela mordia o sanduíche, ele enrolava um cigarro e ria dizendo que não, era mania, selou na língua olhando pro rosto sujo de uma coisa que não era bem lama nem sangue. Você saiu do meu ouvido?
Sim, claro.
E isso, é... ?
Lambeu o rosto com o dedo e olhou: óleo, do Monstro.
O carro?
Não!, o Touro.
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