Há coisa mais bela nos filmes do que janelas falsas?
Sim, é evidente que há. Mas nem por isso deixa de causar um comichão em quem vê, duplamente.
Talvez exista algum bom filme que se passe todo num quarto cheio de quadros e lareiras rodopiantes que levam as pernocas lá longe. Talvez seja um filme muito cruel, sobre alguém que se vê preso pelo tesão de olhar por entre molduras. Talvez seja um filme ainda mais cruel se não tomar isso como metáfora, mas ter sua parte no real. Pois se não temos lareiras, certamente que temos quadros, ou ao menos desktops.
Queria saber explicar sem perdas aquele leve tapa por detrás da testa quando vi a cena do dono do teatro-bar, exibindo seu escritório minúsculo, mas revestido de tapetes e papéis e madeira de forma a dar valor à produção (tudo é pintado, mesmo que seja pra pintar com exatidão a não-pintura), e lá o dono abre uma janela aqui (pra ver o palco, bussiness going on) e uma outra janelinha acolá (pra ver a clientela no bar, bussiness going off), tudo aos olhos da loura selvagem. Não sei, não sei; acho que há uma tensão nessa coisa louraselvagem-janelasfalsas que chega de modo devastador (porque não avisa que vem, nem que vai). Talvez também seja o fato de que o que se vê como janela dentro, fora já é outra coisa, um quadro, talvez um alce, talvez até mesmo a cabeça de alguém. Como um portal maluco. O filme se chama Heller in pink tights, de 1960, George Cukor, fim de western.
Bem, a sensação se perdeu. O texto é impossível sem o subtexto. Seria o contrário também verdadeiro? Pois certamente que existem mais subtextos do que textos nesse mundo, e talvez aí que a literatura e as ciências percam do mundo (ou ganham do mundo).
Tanta coisa é preciso ser dita para uma questão que é muito simples, ainda que impossível de resolver:
–– o que há nessas janelas falsas? O que há nessas janelas falsas? O QUE HÁ NESSAS JANELAS FALSAS?
espiamos; expiemos.
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